Vendado, sente e entende mais a aflição da cegueira. Nada é
mais nítido que o clarão absurdo que não o faz enxergar; Preso a uma cadeira de rodas, sente a penúria da locomoção de
uma forma que nunca imaginou passar. Alguns passos tão fáceis agora são dispendiosos
em energia. O cansaço parece tão grande e absurdo em andar.
Sem ouvir, entende o silêncio. Monstro que mora em meio aos
efeitos de sonoplastia e gritos e se silencia. Sente o incomodo de não entender
o que dizem e a música que tanto lhe fez bem e que lhe serviu de fuga, não
existe mais. Agora só sente as vibrações do som pelo corpo durante o dia.
A voz estremece. Ao abrir a boca nada saia. O silêncio volta
como carrasco que é. Não existem mais palavras de amor, aconchego. Não há mais
como cantar o mundo em contos. Ninguém vai ouvir seu grito de arrego.
Preso nessa vida miserável, sem carro do ano, emprego
estável e de boa remuneração. Tudo acaba como começa, de forma imprevisível (e sem
admiração). O planejamento como sempre falhou em seguir o que foi estudado. O
que era tudo, senão reflexo de sua posição social? Seus direitos são garantidos
pelo dinheiro trabalhado. Seu respeito pelo status. Descascaram a personagem e
encontraram a figura humana (só e arrasado) .
A mente não consegue pensar direito. Os risos e as piadas
não possuem mais graça. A doença lhe parece algo confortável. Dores físicas não
parecem ser tão ruins quanto a que sente na mente como principio da desgraça.
Uma agonia em estar e ser. Dizer e não ter o que falar e sentir deplorável.
Humanos caminhando,
conversando e se interando e para si, e isso parece ter falhado em fazer
sentido. A mente lhe engana, prega peças e hesita em testar seu instinto de
sobrevivência amaldiçoado. O que consta é ausência de sentido. A dor alheia não
parece interessante até sentir na pele. Até se quebrar os ossos. Até perder suor,
sangue e a alma, ainda assim nada compreende.
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